sábado, 27 de abril de 2013

Khronos

Não disseram o tão temido "adeus" - ambos odiavam aquela palavra -, não houve uma grande briga que culminou no instante de agora. Ele sentado na laje diante das estrelas, vendo aquela Lua completa, cheia. Ela, provavelmente sentada na cama, mesmo com a poluição luminosa podia ver algumas estrelas pontilhando o céu e a lua brotando entre dois prédios ao longe. Entre os dedos aquela pequena luz alaranjada. Ele, milhas distante, torceu o nariz praquela "coisa". Ela sorriu de canto e arremessou a bituca oito andares abaixo, ele sorriu imaginando aquela ponta, ainda fagulhante, batendo ao chão e sendo atropelada, esmagada e, finalmente, varrida por algum gari.

Tinham na lua o seu telefone, o seu email, o seu skype particular. Diziam ter pago uma fortuna pra instalar uma linha privativa do coração dele até a lua e dali pro coração dela. Não havia atraso na mensagem. Era instantaneo. Podia chover, podia cair asteroíde, podia explodir mil bombas, que a conexão deles nunca caía. Porém (sempre ele) nos últimos tempos, por falta de tempo, a linha vivia muda. Ainda ouviam ecos, distantes, se ligassem na operadora desse sistema incrivelmente mirabolante eles diriam estar tudo na perfeita normalidade. Mas então... o quê estava ocorrendo? A voz dela se perdia. A voz dele se perdia. Os ecos iam sumindo, sumindo, sumindo até quase desaparecerem por completo.

Restavam as mensagens gravadas, as fotos, as lembranças. Cada estrela gravava um momento que era possivel acessar sempre que fosse preciso. Mesmo com o céu repleto de nuvens ainda algumas estrelas ousavam romper a camada de nuvens e trazer uma mensagem gravada. Aquela que fazia brotar no rosto de ambos um fino sorriso. Um olhar de canto no maldito "tic-tac". Era hora de se recolher. Amanha o tempo seria contado. Khronos, saiu vitorioso, pelo menos por enquanto. Pelo menos até que se ache uma pedra grande o suficiente para faze-lo engolir.

quarta-feira, 3 de abril de 2013

Ponto

Não andava bem, e não era apenas pelo pé arranhado, o calcanhar partido. Era algo maior, algo interno... não, algo interno também não cabia pro que sentia. Maior, maior, infinitamente maior que o que podia carregar dentro de si - e olha que podia carregar muita coisa dentro do peito! - ou nas mãos. Algo externo a envolvia, lhe cobria dos pés a cabeça. Meditação foi a sugestão que deram. Sentar na clássica posição de lótus, respirar suavemente, acender um incenso de alguma fragrância levemente adocicada e apreciar o silêncio. Algo relativamente impossivel com o trafego de aviões constante. Só tarde da noite teria a quietude para - tentar - meditar. Ainda que não acreditasse em meditação tinha de tentar algo.

Se fosse alguns anos atrás já teria abandonado todos os controles e voltado àqueles pensamentos de forma mais intensa. Teria voltado ao frio do metal. Ao frio do mar. Ao vento do parapeito no terraço do prédio. Agora tinha controle sobre esses pensamentos. Agora podia se concentrar sempre que viesse uma onda saudosista por aqueles pensamentos, por aquelas atitudes. Respirava fundo e pronto. Tomava um colorido e pronto. Tomava um porre e pronto. Sempre dava certo. Sempre até agora.

Respirou fundo até quase perder o folêgo. Tomou coloridos até quase dormir dias seguidos. Tomou porres um em cima do outro. Nada mais fazia efeito. Fechava os olhos, buscava explicação, buscava o ponto chave do que lhe incomodava. Buscava dentro de si o que estava apegado à alma.