sexta-feira, 28 de agosto de 2015

Céu Azul

O céu azul era uma afronta ao humor dele. Se o céu estivesse cinza, fechado estaria mais próximo do humor dele. Aliás, se estivesse completamente fechado, um céu completamente escuro, típico de antes da tempestade, melhor. Mas não. Claro que ele tinha momentos em que o céu azul era reflexo do humor dele, mas esses momentos duravam cada vez menos. Uma saída, uma noite, uma festa, as companhias, tudo era bom. Mas cada vez mais efêmeros.

Não havia culpados nem absolvidos. Talvez o mundo, ou talvez não. Sentia falta de algo crepitando em seu peito. Aquela velha chama, aquela ânsia de correr atrás de novos objetivos, de amores a muito cultivados. Tudo isso acabou tal qual um disco que chega no fim e pára de rodar quando a agulha toca o miolo do disco. Sempre teve algum motivo ou objetivo que lhe fazia sempre ou virar o disco, ou voltar ao começo. Algo Machadiano. Machado? Por um instante um velho pensamento lhe correu por toda a mente, materializou-se na espinha e voltou ao cérebro. Fausto e Mefistófeles. Tinha de ler logo esse livro. Anotou mentalmente essa observação.

No fim mais uma semana corria sem grandes sobressaltos. Nada novo. Nada velho. Nada requentado. Apenas aquela maldita rotina. Quando pensava em rotina ele sentia ânsia de largar tudo. Jogar tudo para o antigo e empoeirado foda-se. Não. Não podia. Ainda não. Tinha compromissos. Mais três anos dizia a razão. Mais três anos, dizia a prudência. E depois? Será que o velho sentimento de sumir dali voltaria? Será que depois de tantos anos ainda teria fôlego para sair? Tinha de sair. Isso era um fato. Mas... não. Balançou a cabeça negativamente. Não era hora de pensar nisso.

Então estava decidido a ficar assim? Tinha de ter uma saída. Tinha? Novamente Fausto voltou ao pensamento. Machado. Preferiu pensar em Machado. Atar as duas pontas e assim reviver a mocidade. Ainda que não fosse velho, tinha muitas memorias e pensamentos que deviam ser tirados da mente e guardados em um baú. E como se fazia isso? Colocando novos pensamentos. Mesmo com o aniversário longe tinha entrado naquela aura existencialista que ficava acometido todo ano nas semanas que antecediam a nova idade. Precisava sair. Desse final de semana não passaria aquele passeio a sós que faria. Quer dizer, a sós não. Aquele passeio de sigo consigo mesmo. Estava decidido. E agora? Passou a tolerar mais o céu azul? Não. O humor melhorou, mas ainda preferia que o céu estivesse cinza. Apenas cinza. E isso, era o melhor que podia fazer pelo dia de hoje.

quinta-feira, 27 de agosto de 2015

Noite de Chuva

Os dias se seguiam um igual ao outro. Claro que não totalmente iguais, mas, ainda assim não haviam grandes sobressaltos,  um dia era mais normal que o outro, o outro era mais normal que um. Por um instante, enquanto ouvia a chuva bater com relativa força no telhado se lembrou de uma conversa que havia tido com um colega de trabalho que se dizia sufocado pela rotina. Ele, por sua vez não sentia isso. Não até agora. Tentava buscar na memória um motivo para sua recente calmaria. Não encontrava.

Até que, revirando gavetas achou uma foto. Aquele olhar dela, o olhar que Paulo Ricardo eternizou, aquele meio de lado, já saindo, indo embora. Como haviam chegado nesse ponto? Bem dizem que quando um não quer dois não brigam. 

Suspirou imaginando-a na janela, cigarro aceso e os mesmos sentimentos. Será? Resolveu se deitar. Amanha teria outro dia "empolgante" no trabalho. Rotina de merda. Fechou os olhos, a chuva perdeu o ritmo. Adormeceu.