domingo, 29 de novembro de 2015

Álibi VII e VIII - Prólogo

O plano estava feito. O azar do seu noivo com a perna quebrada era um azar dela também. Tinha de agir com mais discrição do que nunca, não que isso fosse um problema. Mas nos últimos tempos ela andava mais relapsa, menos sutil, até um pouco brutal. A ação anterior saiu em vários jornais. Tudo que sabiam era que o proprietário do lugar era investigado por aliciar crianças para uma rede de prostituição. 

Com um copo quase vazio de conhaque barato na mão onde duas pedras de gelo teriam o fim trágico de toda pedra de gelo, Sophia tramava o derradeiro ato deste ano. Teria de ser duplo. Apenas uma vez na vida fez algo assim e, essa apreensão por fazer algo relativamente novo a deixava mais nervosa. Por isso o conhaque que, Sérgio, insistiu em dizer que era paraguaio. Ela não o ouvia. Quer dizer. Ouvia, respondia, reagia, elaborava respostas, mas não sua parte racional. Deixava o corpo responder sozinho. Ligou o piloto automático para ele.

Como ele estava no sofá, perna esticada sobre um amontoado de almofadas, assistindo alguma série no netflix ela, postada não mais do que seis metros atrás, em uma pequena mesa, dizia ter um trabalho de faculdade "muito foda" que era pra ter sido em grupo mas o grupo deu pra trás e ela estava "se fodendo sozinha". Sérgio brincou dizendo que poderia dar voz de prisão pros tais amigos. Sophia riu-se e disse que não seria má ideia.

Sem muito esforço descobriu que o alvo sete e o oito frequentavam o mesmo bar em uma área próxima da maior represa que fornecia água pra essa cidade fétida. Por mais que morasse aqui tinha aprendido a nutrir certo ódio pela cidade. Não que sua cidade anterior fosse o paraíso, mas era melhor que esse caos, esse barulho eterno. Se ela pudesse fugia dali. Mas muito ainda tinha pra ser feito.

Estratégia traçada. Ainda era cedo quando Sophia decidiu que teria de resolver isso hoje, agora. Odiava protelar coisas. Ainda mais coisas tão simples. Só precisaria de um carro qualquer. Beber um pouco. Liquidar a fatura e fim. Mas como sair? Sérgio parecia um cão de guarda. Será que ele suspeitava de algo e, na verdade, não tinha quebrado a perna e estava ali para vigia-la?

Paranoia. A vez passada também teve esse tipo de paranoia e não foi o final feliz que tinha planejado. Embora soubesse que nunca teria um final feliz, pessoas como ela não mereciam finais felizes. Por isso misturou ao suco de Sérgio um remédio para dormir. Dois dramins moídos seguidos de uma aspirina pra aliviar as dores da perna que, provavelmente, estaria quebrada mesmo.

Deu o remédio e esperou. Trinta e dois minutos e Sérgio dormia igual um bebê no sofá da sala frente ao netflix ligado. Que cara de sorte, dormiu bem no fim do episódio. Sophia desligou a televisão e o cobriu. Rapidamente trocou de roupa. Um vestido mais sensual, um salto mais alto, uma maquiagem pesada e estava pronta.

Ao sair pela garagem foi até o carro. Ameaçou pega-lo, mas, na verdade, deixou ali uma bolsa com a roupa para colocar na volta. Saiu passando o muro dos fundos. Por um aplicativo chamou um carro. Gostava de certas modernidades. O aplicativo não guardava itinerários, passageiros, só distâncias. E o motorista não era como taxistas típicos. Ele se ateve a perguntar o destino e, ao fim da corrida, o valor. E, em nenhum momento ele olhou para ela pelo retrovisor. Perfeito.

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