terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Álibi VII e VIII - Epílogo

Sem muito esforço estilhaçou a janela de um deles e o arrombou. Quem liga pro alarme? Um alarme dispara no meio da madrugada e as pessoas só reclamam do barulho, não se importam em procurar saber se não é o carro delas. Assim Sophia chegou próxima de algumas ruas onde pequenas lanchonetes alimentavam jovens casais. Sorriu de canto. Agora estava em segurança. Do celular com chip clonado pediu um carro ao aplicativo. Demorou alguns minutos e lá estava o carro. 

Podia ir até próximo do seu prédio. Mas, além da corrida ficar muito cara, seria ruim. Por isso optou por descer dezoito quarteirões antes da sua rua. Lá pediu outro carro que a levou para próximo de um conjunto de apartamentos onde moravam alguns viciados em drogas, prostitutas e pessoas humildes. Se não a memória de Sophia não falhava aquele era o antigo prédio de Sérgio. Ela lembra de ter vindo com ele uma vez recolher a correspondência. De lá pediu mais um carro. Foi até seis quarteirões do seu prédio.

Por causa de todas essas manobras teve um pouco de dificuldade em pagar o último. Faltaram três reais. Por já ter passado das duas da manhã o motorista deixou passar. Agora era caminhar até seu prédio, sandálias nas mãos. Dar um fim em mais um chip de celular no primeiro boeiro que aparecesse. Ir até o carro e trocar de roupa.

Disparou o alarme do próprio carro e voltou correndo para o apartamento. Vinte segundos depois de entrar lá estava Sérgio. Na mesma posição. O interfone tocou. O prestativo porteiro da madrugada avisava que o carro estava com o alarme disparado. Sophia sorriu de canto e desceu desliga-lo.

Foi até a garagem. Desligou o alarme e pediu mil desculpas ao porteiro. Ao reentrar no apartamento encontrou Sérgio sentado no sofá acordado. Queria saber quem tinha ligado e onde ela tinha ido. O alarme disparou, amor. Ela respondeu o recomendando ir para a cama. Ele aceitou a sugestão e ambos foram para a cama.

Ela se cobriu. Sérgio ainda demorou alguns instantes dizendo estar no banheiro. Em seguida ele veio do banheiro. A nove milímetros que ele usava diariamente na mão direita. Uma lágrima se desenhava no canto do olho dele. Sophia demorou um instante para nota-lo com a arma em punho. Por que? A pergunta dele era justa. A falta de resposta dela também. Ele se aproximou. O temido fim havia chego. Merda. 

Pessoas emocionalmente instáveis são perfeitamente calculáveis. A mão de Sérgio estava trêmula. Ele não acertaria uma baleia mesmo que estivesse sentado em cima dela. O mais foda nisso tudo era que, apesar de não parecer, Sophia gostava dele. Esperava que pudesse ter algo com ele que durasse mais tempo, quem sabe ela até pudesse parar com aquela coisa dela. Tudo isso virou poeira que o vento levou.

Ele caminhou para perto dela dizendo que já tinha alertado algumas viaturas que chegariam em alguns minutos e que era hora dela se entregar. Mais dois passos se fizeram. Sophia já estava sentada à beira da cama. Mais um passo e pronto. O abajur virou cacos na cabeça de Sérgio. Não duraria muito o efeito do desmaio. A arma estava com a trava, por isso não disparou na queda.

Em um minuto e trinta segundos Sophia pegou todas as roupas que conseguiu socar em uma mochila e em uma mala grande, dessas de rodinhas. Na sala pegou o notebook, ponderou escrever uma carta, explicando suas motivações. Não. Não fez isso nas vezes passadas, por que faria agora? Foi até a garagem. Jogou no banco do carona sua pouca bagagem. No caminho passou por duas viaturas da polícia a toda carga indo para o prédio.

Os primeiros raios da manhã surgiam quando ela decidiu largar o carro próximo do gigantesco estádio municipal. Decididamente a pessoa que inventou aquele aplicativo de chamar carros merecia um prêmio. Sophia pediu que ele lhe levasse até a estação do metrô. Lá comprou um boné e outra bolsa para guardar o notebook. Em vinte minutos de metrô estava na rodoviária. Quando o sol, enfim, surgiu no horizonte angular proporcionado por prédios, embarcou em um ônibus indo em direção ao norte do país. A lágrima da ruptura que havia guardado durante a fuga apareceu agora. E junto dela vieram outras. Logo adormeceu completamente exausta. Ao acordar, horas depois, e pensar na possibilidade uma nova cidade sorriu de canto. O futuro, afinal, era promissor e apenas uma dúvida lhe vinha à mente: que cor pintaria os cabelos?